Enquanto Você Rola a Tela, Eles se Perdem: O Drama Invisível da Adolescência Digital

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Um estudo da Universidade de Oxford, publicado em 2024, revelou que adolescentes que passam mais de três horas por dia nas redes sociais têm 60% mais chances de desenvolver depressão.

Nos últimos anos, as redes sociais — antes vistas como simples entretenimento — se tornaram influenciadoras silenciosas do comportamento adolescente. A série Adolescência, da Netflix, lança um alerta urgente: a cultura digital está moldando, em silêncio, a formação emocional e psicológica de uma geração inteira. E escancara um problema que governos e Big Techs preferem ignorar — o ambiente online, sem mediação ou regulação, pode ser profundamente nocivo para crianças e adolescentes.

Como mãe de dois adolescentes, assisti à série com um nó na garganta. A história de um garoto de 13 anos acusado de um assassinato brutal — potencialmente influenciado por ideologias misóginas encontradas na internet — escancara um pesadelo cada vez mais comum nas famílias: o acesso irrestrito a conteúdos tóxicos, a normalização da violência e a formação de comunidades extremistas nas sombras da internet não são mais distopias. São realidades diárias.

A adolescência já é, por natureza, um período de intensas transformações físicas, emocionais e sociais. O cérebro ainda está em formação, a identidade se molda, e o pertencimento se torna vital. É justamente nesse momento de vulnerabilidade que operam algoritmos projetados para capturar atenção, viciar e manipular comportamento — sem critério ou segurança.

As plataformas sabem exatamente como manter um adolescente rolando a tela: sugerem conteúdos cada vez mais extremos, reforçam padrões inalcançáveis de beleza, sucesso e performance, e promovem uma cultura de comparação constante. O resultado? Crises de identidade, ansiedade, raiva e solidão em escala crescente.

Adolescência, a série, expõe tudo isso. E deixa uma pergunta urgente no ar: quem está cuidando dessa geração?

O Silêncio Conveniente das Big Techs

A resposta mais honesta? Quase ninguém. As gigantes da tecnologia — Apple, Google, Meta, X e Microsoft — seguem operando com ampla liberdade para negligenciar seus impactos. Mesmo diante de uma avalanche de estudos, como o de Oxford e os dados da American Psychological Association, que associam o uso excessivo das redes a altos níveis de ansiedade, depressão e baixa autoestima, as plataformas continuam priorizando o lucro e o engajamento.

O discurso institucional é sempre o mesmo: “Estamos comprometidos com a segurança dos nossos usuários.” Mas os algoritmos continuam operando no escuro — alimentando ciclos de vício e desinformação, sem transparência nem limites.

Avanços tímidos, resistência feroz

Alguns países vêm tentando reagir. França, Austrália e Brasil já limitaram o uso de celulares em escolas. O Reino Unido debate o acesso de menores às redes sociais. A União Europeia avança com o Digital Services Act, exigindo mais transparência algorítmica e proteção para menores. Mas nos Estados Unidos — onde estão sediadas as principais empresas — qualquer tentativa de regulação enfrenta lobbies bilionários e forte resistência.

Enquanto isso, quem protege os jovens?

O Papel das Famílias, da Sociedade e das Lideranças

Não podemos esperar que as plataformas mudem por iniciativa própria. Como mãe, me pergunto todos os dias: como proteger meus filhos em um ambiente feito para capturá-los?

A resposta está em três frentes: supervisão ativa, diálogo constante e pressão social por regulação séria. Celulares não são apenas dispositivos de comunicação: são portais que moldam visões de mundo, valores e identidade. A mediação adulta — com empatia, presença e escuta — nunca foi tão urgente.

Mas isso não pode recair apenas sobre as famílias. Precisamos de líderes públicos, educadores, empreendedores e investidores comprometidos com um ecossistema digital mais humano. Regular algoritmos, criar plataformas seguras e investir em tecnologias com propósito ético não é utopia — é necessidade. E é possível.

O Futuro Exige Urgência

Uma frase da série me marcou profundamente: “É preciso uma vila para criar uma criança. Mas também basta uma vila para destruí-la.” Hoje, essa vila é digital — e está sendo dominada por sistemas opacos que exploram nossas vulnerabilidades, principalmente as dos mais jovens.

Já passou da hora de mudarmos esse jogo. Se queremos proteger a sanidade da próxima geração, precisamos encarar as redes sociais pelo que elas realmente são: ferramentas poderosas, que exigem responsabilidade, limites e transparência.

Essa mudança começa no topo — com as empresas que lucram com a atenção e a inocência das nossas crianças — e se estende até cada um de nós. Está na hora de abandonar a cultura da negligência e construir, juntos, uma nova cultura: a do cuidado.

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